segunda-feira, 26 de dezembro de 2016


Capricórnio, imagem de um animal fantástico na numismática romana.

Na mitologia romana, um animal híbrida meio bode, meio peixe que segundo Caio Juno Higino, na realidade o Capricórnio é Pan.
Para este autor, os deuses por causa do terror que lhes inspirou o gigante Typhon, transformaram-se em diversos tipos de animais.
(C.J.Higino: escritor da Roma Antiga, seria natural da Península Ibérica, talvez Valência dos Edetamos “Valência Edetanorum”, Hispânia, por cerca do ano 64 a.C., e faleceu em Roma no ano 17a. C..)

Pan foi o último a adotar esta solução e, ao mergulhar no rio, tomou a forma de um animal estranho híbrido, com cabeça e tronco de cabra e cauda de peixe.

Augusto-Áureo cunhado em Pérgamo no ano 19 a.C.
Anv. Augusto à direita, AVGVSTVS
Rev. Capricórnio à direita,
SIGNIS RECEPTIS
(Ref. RIC-521, BMC-680, Calicó-272, Giard-1011 (Paris)

Devido a esta metamorfose talentuosa, Júpiter colocou-o entre as estrelas.  
Foi por esta razão que Aratus lhe chamou Aegipan (Egipan).

(Aratus: Arato de Solos, poeta grego da corte do rei Antígono Dóson rei da Macedónia, século III a. C..)

(Aegipan: Egipan, divindade mitológica campestre, meio homem, meio animal, aparece quase sempre dotado de pés e orelhas de cabra: era associado ao deus Pan.)

Augusto-Denário cunhado em Lião no ano 12 a. C.
Anv. Augusto à direita, DIVI AVGVSTVS
Rev. Capricórnio e globo, IMP XI
(Ref. RIC-174,I, BMC-465)

Este tipo de Capricórnio aparece com muita frequência em moedas do imperador Augusto, com legenda  latina ou grega.

Segundo Suetónio, a razão da presença do Capricórnio nas moedas do imperador é a seguinte:
Aquando do seu retiro em Apolónia, Augusto acompanhado por Agripa terão subido até ao observatório do adivinho Teógenes.

Este prediu a Agripa uma prosperidade maravilhosa. Augusto temendo alguma mau predição, recusou divulgar o dia do seu nascimento.

Depois de muito hesitar e a pedido de Agripa, Augusto deu a data de nascimento ao bruxo e, qual não foi o seu espanto quando este se levantou e prosternou-se aos seus pés!

Augusto-Cistóforo de prata cunhado em Efeso cerca de 25-20 a.C.
Anv. Augusto à direita, IMP CAESAR
Rev. Capricórnio e cornucópia no interior de uma coroa de louro, AVGVSTVS
(Ref. RIC-480(c), Cohen-16)
(Este cistóforo com a valia de 3 denários, foi cunhado para circular na Ásia Menor.)

A partir daí, Augusto teve tanta confiança no seu destino que publicou o seu horóscopo e, mandou cunhar moedas com o seu símbolo: o Capricórnio.
(Suetónio: vidas dos doze Césares, Augusto 94.)

Outros testemunhos de autores antigos, também atestam que Augusto nasceu realmente sob o signo do Capricórnio e, que o imperador era particularmente supersticioso.
Na sua numária, além do Capricórnio, vemos muitas vezes representações de cornucópias, uma estrela, um leme ou um navio.

Augusto-Denário-cunhado provavelmente na Gália) no ano 27 a.C. a.C.
Anv. Augusto à direita
Rev. Capricórnio e uma estrela,   AVGVSTVS
(Ref. RIC-542)

Este símbolo também é visível em moedas dos imperadores Vespasiano, Tito, Domiciano e, em raras moedas  de Adriano e Antonino Pio.
Alguns bronzes de Domiciano com a legenda AVGVSTVS IMP XX, apresentam este símbolo acompanhado de uma cornucópia.

O globo como símbolo do mundo, apareceu nas moedas romanas no ano 742 (=11 anos d.C.), visível em moedas de Augusto entre as pernas do Capricónio.

Augusto-Denário cunhado em Colônia Patrícia (Espanha) 18-16 a.C.
Anv. Augusto à direita
Rev. Capricórnio, cornucópia e globo, AVGVSTVS
(Ref. RIC-126, Cohen-21)

Cunho monetário de Augusto

Vespasiano-Denário cunhado em Roma cerca de 79 d.C.
Anv. Vespasiano laureado à direita,
IMP CAES VESPASIANVS S AVG
Rev. Capricórnio e globo,
TR POT X COS VIIII
(Ref. RIC-118c, Cohen-554)

Vespasiano-Denário cunhado em Roma 80-81
Anv. Vespasiano laureado à direita,
DIVVS AVGVSTVS VESPASIANVS
Rev. Dois Capricórnios sustentando um escudo com a inscrição S C, um globo por baixo do escudo, .
(Ref. (RIC 2-19, RSC-280)

Este tipo de reverso que também aparece em raras moedas de Tito, é uma marca da felicidade do Império Romano, que sob estes dois príncipes, pai e filho, era forte como na época de Augusto.

Tito-Denário cunhado em Roma 79-81
Anv. Tito laureado à esquerda,
IMP TITVS CAES VESPASIAN AVG PM
Rev. Capricórnio e globo,
TRP VIIII IMP XV COS VII PP
( Ref. RIC-37, RSC-294, BMC-235)

Capricórnios, também são visíveis em moedas dos imperadores Galiano e Caráusio, como símbolo de algumas legiões.

Galiano-(Antoniniano cunhado em Milão no ano 258
Anv. Galiano com coroa radiada à direita,
GALIENVS AVG
Rev. Capricórnio, LEGI ITAL VI P VI F
(Ref. RIC V-1 Milão 315, Gobl-0982, Sear-102549)

Caurásio-Antoniniano cunhado em Londres 287-293
Anv. Caráusio com coroa radiada à direita,
IMP CARAVSIVS PF AVG
Rev. Capricórnio, LEG II AVG ML
(Ref. RIC-58,9)

Este animal estranho, meio bode, meio peixe, décimo signo do Zodíaco e, um dos quatro pontos cardinais (sul) existe, mas apenas na imaginação dos homens.

MGeada

Bibliografia
 
Philipe Bodet: le Capricorne, Symbole Parlant sur les Monnaies Romaines.
Daremberg et Saglio : Le Dictionnaire des Antiquites Grecques et Romaines.
Frédéric Weber : Catalogue des Monnaies de L’Empire Romain.
Michel Prieur : Les Monnaies Romaines-Setembro 2004.
George Depeyrot : Monnaies Romaines : Histoire et Vie D’un Empire-dezembro 2014.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2016



Nossa Senhora da Conceição
Moeda mandada cunhar por D. João IV por decreto-lei de 25 de março de 1646

Padroeira de “Alcains” e de Portugal, Conceição foi o nome que D. João IV deu à moeda que mandou cunhar para comemorar a adoção que fizera de Nossa Senhora da Conceição para padroeira do Reino de Portugal nas cortes celebradas em Lisboa no ano 1646.

No dia 25 de março de 1646, dia de Ramos, perante a Corte e representantes do Reino e cinco bispos reunidos na Capela Real dos Paços da Ribeira, realizou-se esta solene cerimónia de juramento.
Pedro Vieira da Silva leu em voz alta o texto e, por fim a fórmula de juramento que o rei ajoelhado diante do altar foi repetindo.
O mesmo fizeram o príncipe. os grandes representantes do povo e os bispos presentes.
O ato terminou com o solene Te Deum. 

O Rei prometeu à Senhora da Conceição em seu nome e dos seus sucessores, um tributo anual de 50 cruzados de ouro e,  ordenou que os estudantes da Universidade de Coimbra, antes de tomarem algum grau de instrução , jurassem defender a Imaculada Conceição. 

D. João IV não foi o primeiro rei português a colocar o reino sob a sua proteção, apenas decretou que fosse permanente, uma devoção a que os nossos reis recorreram muitas vezes em momentos críticos  para Portugal.

D. João I escreveu nas portas da capital elogios à Virgem e, em 1386, mandou construir o Convento da Batalha (Mosteiro de Santa Maria da Vitória, conhecido por Mosteiro da Batalha). enquanto o seu intrépido companheiro de armas D. Nuno Álvares Pereira no ano 1389 em Lisboa, erigiu à virgem, o Convento do Carmo.

Foi por decreto-lei de  25 de Maio de 1646, que Nossa Senhora da Conceição foi escolhida para padroeira do Reino de Portugal.

Para comemorar este evento, cunharam-se medalhas de ouro de 22 quilates, com o peso de 12 oitavas (1 oitava=3,600 gr) e outras de prata com o peso de uma onça (=28,800gr.) que por lei foram admitidas como moedas correntes.


D. João IV-Conceição, ouro 12 000 réis, cunhada em 1648


D. João IV-Conceição, prata 600 réis, cunhada em 1648

Descrição das moedas

Anv. as armas do Reino coroadas assentes sobre a Cruz de Cristo,
JOANNES IIII, D.G PORTUGALIAE ET ALGARBIAE REX
(João IV pela Graça de Deus Rei de Portugal e dos Algarves)
Rev. Ao centro a Imagem de Nossa senhora da Conceição, aureolada com um conjunto de 7 estrelas, em pé sobre um globo, em volta do qual se enrola uma serpente, tendo por baixo, a data.
Dos lados veêm-se, à esquerda, o Sol, Templo, e Horto (ou Cerrado). À direita, o Espelho, a Arca do Santuário e a Fonte Selada
REGNI TVTELARIS
(Padroeira do Reino)

No ano 1946, para comemorar o terceiro centenário  da proclamação de Nossa Senhora da Conceição como padroeira de Portugal, foi feita uma recunhagem tendo sido introduzido no reverso um elemento novo: as datas de 1646 e 1946 entre os braços da cruz.
Fizeram-se três emissões: em ouro, prata, e cobre.
Estas medalhas têm um módulo de 42mm, e um peso de 80 gr. as de ouro, em prata 41,8 gr., as de cobre 37,2 gr, .


República-Recunhagem de 1946

Simbologia da Conceição




Coroa a imagem da Virgem, um conjunto de 7 estrelas.

O número 7 é o número da vida, da união de Deus com a matéria. (3+4) = as três pessoas da Santíssima Trindade e os quatros elementos da natureza: água, terra, fogo, ar.
Significados que fazem referência  à missão da Virgem Maria.
Com efeito, por Ela vem a vida, e Ela própria é a manifestação da união de Deus com a matéria, (a natureza).

Por outro lado o número 7 indica os graus da iniciação Mariana, traduzida pelas 7 dores da Virgem.
A Virgem  significa a possibilidade criadora e regeneradora. É a Natura (Natureza), aquela que haveria de nascer (pois sem Ela, Cristo não poderia encarnar) e dar nascimento.

De mãos postas indica a alquimia divina de Ora et Labora (reza e trabalha), tão bem aproveitada pela Ordem Dominicana.
Olha para a direita, para o lado favorável, do Bem, da Divindade. Está em pé, que significa manter-se.


Os seus pés pisam a Lua, o símbolo por excelência da mulher, desde os tempos Neolíticos. 
A Lua assenta sobre o mundo rodeado pela serpente, cujo corpo dá um nó.
A serpente foi identificada ao dragão, simbolizando biblicamente o mal. Mas aqui a Virgem não pisa a sua cabeça. Tal facto referencia outros sentidos.

A serpente designa o Ouroboros, símbolo da lei do eterno retorno, de tudo aquilo que está em constante recriação.
É a lei da natureza física; por isso aparece enrolada no globo, que representa a esfera terreste.

(Ouroboros: Figura mitológica, geralmente faz referência à criação do universo e, pode simbolizar a contunuidade, o eterno retorno, o renascimento da terra etc, ).

A serpente é também o símbolo das iniciações maiores e do caminho para as conseguir.
Ao pisar a cabeça da serpente, a Virgem quebrou a Lei do Eterno Retorno para transformar o círculo em espiral.

No entanto, nesta moeda, a Virgem não pisa a serpente, a Lua separa a Virgem do mundo; a iniciação superior, da inferior, o espírito da matéria.
Nesta moeda a serpente é o símbolo da Imaculada Conceição, alusivo à redenção do pecado original operado em Maria por especial previlégio na sua concepção.

Rodeiam a figura da Virgem seis figurações, que correspondem a invocações de ladainhas da Virgem. Não existe uma relação simples; com efeito, alguns dos símbolos utilizados podem referir-se a várias invocações.


O Sol, designa a Divindade e a Criação (Santa Mãe de Deus; Mãe do Criador).

O Espelho, designa o espelho da justiça. Na concepção tradicional a mulher simbolizada pela Lua, é o espelho do Sol.


O Templo, é a sede da sabedoria. A Virgem Maria representa a visibilidade do Feminino Divino. 


A Arca de Noé, significa a Arca da Aliança. A Virgem exprime o momento da aliança real de Deus com o Homem, a matéria, a natureza. (Segundo a Bíblia, a Arca de Noé conservou a natureza).


O Horto (ou Cerrado), é o refugio dos Pecadores. Neste jardim fechado símbolo do Éden, os pecadores encontram o seu estado primeiro, quando o homem vivia em  armonia total com Deus.


A Fonte, é a saúde dos doentes. Repete-se com as devidas variações o sentido anterior. 

O número seis (referência a estas seis simbologias) indica sucessivamente a união do Criador com a Criatura. A harmonia dos opostos através de um eixo central (a própria Virgem), o Coração, a Beleza, a Vida, o Sol. 
Relaciona-se com a diversificação, a multiplicação, a reintegração, “tudo funções afirmadas pela ladainha da Virgem”.

A moeda coloca deste modo, o conhecimento das duas iniciações. O Reino (de Portugal) só poderá ser tutelado pela iniciação superior e não pela iniciação inferior.
Por esta, estará sujeita a todas as eventualidades históricas, normalmente adversas; por aquela, surge a garantia de vencer as incertezas terrestes.


350 ̊ Aniversário da Proclamação de N.S. da Conceição Padroeira de Portugal
1 000$00 prata cunhada em 1996.

Anv. Campo preenchido por um manto estilizado, sobreponde-se ao centro o escudo das armas nacionais, orlado na parte superior pela legenda República Portuguesa, e na orla inferior pelo valor facial 1000$00.

Rev. Ao centro a imagem da Senhora da Conceição de corpo inteiro com o menino ao colo, coberta com um manto, devidamente coroados, assentes numa meia lua, com diversas coroas a comporem parte do campo, orlados com a legenda  N. S. DA CONCEIÇÃO PADROEIRA  DE PORTUGAL

MGeada

Bibliografia

José Valério; Moedas Comemorativas Portuguesas, edição do autor, 2010.
Alberto Gomes ; Moedas Portuguesas e do Território Português Antes da Fundação da Nacionalidade.
António Miguel Trigueiros: A Conceição, Moeda, Medalha e Venera da Padroeira do Reino-Lisboa, 8 de dezembro de 2008-8 de maio de 2014.
Salgado; Javier Sáez- História da Moeda em Portugal, 2002.
http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/13591.pdf