segunda-feira, 10 de dezembro de 2012


SALONINA

    Júlia Cornélia Salonina, imperatriz romana de 254 a 268.
  Segundo a História de Augusto, Salonina seria originária da Bitínia, (Norte da Turquia atual) e casou com o imperador Galiano no ano 253.
    O casal terá tido três filhos: Salonino, Valeriano II e  Jules Galiano.
   A existência  de pelo menos dois, Salonino e Valeriano II, nomeados César quando teriam cerca de doze anos, é confirmada por moedas e inscrições lapidárias mas, é provável que o casal tivesse tido outros filhos, porque alguns (raros) documentos escritos, evocam também os nomes de Marinianus e Gala, mas a sua existência é todavia improvável. 

Salonino-Antoniniano, Lião 256. 
Anv. SAL(ONINVS) VALERIANVS C S (CAES)
Rev. PRINC INVENT
Ref. RIC V-1, 10, Cohen 61, Sear5 10770

Valeriano II-Antoniniano, Roma 258/259
Anv. P C L VALERIANVS NOB CAES
Rev. PRINCIPI  IVVENT
Ref. RIC 23, RSC 81

Salonina-Antoniniano, Roma 256/257
Anv. SALONINA AVG
Rev. PIETAS AVG - Pietas  sentada num trono à esquerda e três crianças.
Ref. RIC v-1, 35, Gobl 229 b, RSC 84, Sear 10647.

  A legenda FECUNDITAS (Fecundidade) AVG(VSTA) aparece com muita frequência nos reversos das suas moedas.

Salonina–Antoniniano, Roma 256/257
Anv. SALONINA AVG
Rev. FECVNDITAS AVG
Ref. RIC V 26, Cohen 44, VF

    Ainda durante o reinado de imperador Valeriano I,(seu sogro)foi elevada à dignidade de Augusta e, após a morte da imperatriz Mariniana (sua sogra) passou a ser a única imperatriz em exercício durante quinze anos.
   Salonina recebeu ainda a dignidade de PIA FELIX, fato excepcional porque só as imperatrizes Julia Domna  e Severina, tinham beneficiado desta distinção no século III.  
   Além de alguns bustos nos museus do Capitólio, da Hermitage, de São Petersbourg e, alguns documentos escritos (História de Augusto) a imperatriz Salonina, deixou-nos numerosas moedas que nos informam sobre os seus valores e vicissitudes do seu longo reinado.
   Relatados por muitos autores, os atos de benevolência atribuídos a Salonina tornam-se ainda mais credíveis por se inserirem perfeitamente na história daquela época.
   A captura de Valeriano I, pai de Galiano, por Sapor I (rei da Pérsia sassânida  entre 241-272), em 258 ou 259, causou grande emoção em todo o Império Romano.
 Após a morte de Trajano Décio, grande persecutor dos cristãos e, primeiro imperador romano morto em combate, os cristãos viram ali um sinal, um castigo da vingança divina.
  Talvez  por ansiedade  de escapar ao destino fúnebre dos seus antecessores, Galiano logo em 260, promulgou um édito de tolerância para com os cristãos.
  Desconhecemos se esta decisão foi influenciada pela imperatriz mas, é provável pelo fato de  eles já serem casados há muito tempo e, também pelos gestos de clemência de Salonina em 261, coincidirem perfeitamente com o édito.
   É portanto muito credível, Galiano ter sido influenciado por sua esposa.
   Mas estes gestos de clemência fariam da imperatriz uma cristã ?
 Sem dúvida não, visto que  Salonina e Galiano frequentavam assiduamente os filósofos Porfírio 234/305 e Plotino 205/270, cujas teses rejeitavam os cultos e dogmas cristãs e, também pelo fato de Galiano pensar construir em  Campania (ou Campanha), uma nova cidade dedicada ao filósofo Platão.
   As moedas da época cofirmam  esta orientação pagã, e apresentam durante os quize anos de reinado uma iconografia constantemnte dedicada aos deuses de Roma e, termina com uma série do bestiário onde a imperatriz se coloca sob a proteção da deusa Juno, com a legenda IVNONI CONS(ERVAT) AVG(VSTA) , A Juno protetora da imperatriz.

Salonina-Antoniniano, Roma 267-268
Anv. SALONINA AVG
Rev. IVNONI CONS AVG
Ref. RIC 15, Sear88 3041, Cohen 70.

Salonina-Antoniniano, Roma 266/267
Anv. COR SALONINA AVG
Rev. IVNONO CONS AVG
(Curiosa legenda IVNONO -  erro do artista monetário???)

    Os pricipais reversos da imperatriz colocam-na sob a proteção das deusas Juno, Vesta, Ceres, Segesta, Diana, ou louvando a saúde (SALIS), fertilidade (FECUNDITAS, felicidade (FELICITAS PUBLICAE).

Salonina, Lião 258
Anv. SALONIA AVG
Rev. DEAE SEGETIAI - (Imagem e templo da deusa Segesta.)
Ref. RIC V-1, 5 Lyons, Elmer 96, Sear 10631.

    Segesta aparece únicamente em moedas de Salonina.
   Este templo construído no interior do Circo Grande em Roma e, posteriormente mudado para o exterior a mando desta  imperatriz, pensa-se ter sido  mandado erigir por ela.
    Anteriormente, apenas um pequeno altar em Roma lhe era dedicado.

Salonina-Antoniniano, Ásia 267
Anv. SALONINA AVG
Rev. SALVS AVG
Ref. RIC 88, RSC 105, Sear5  10652 

    Difícil portanto de considerar no meio deste oceano de paganismo, que o reverso com a legenda AVGVSTA IN PACE ou AVG IN PACE (imperatriz em paz), possa ser um índice de  simpatia de Salonina para com os cristãos.
    A menção IN PACE, encontra-se nas sepulturas cristãs, (REQUIESCAT IN PACE - repousa/em em paz).

Salonina-Antoniniano, Milão 260/268
Anv. CORN SALONINA AVG
Rev. AVG IN PACE
Ref. RIC 57 var., Gobl 1378.

    Mantemos por nossa parte uma imperatriz não cristã mas, compreensiva e tolerante, da qual a sua história não relata nada de negativo, (salvo a sua irritação quando foi burlada por um negociante de pedras preciosas, “História de Augusto”).

UMA CUNHAGEM IMPORTANTE DURANTE UM PERÍODO PERTURBADO

   Mesmo se tiver-mos em conta o seu longo reinado, a cunhagem das moedas de Salonina foi muito importante.
   Às centenas de tipos de antoninianos conhecidos, juntam-se as moedas de ouro (áureos), os bronzes (sestércios, asses, dupôndios), prata (raríssimos quinários, tetradracmas de Alexandria e inúmeras moedas provinciais e coloniais).

Salonina-Quinário, Roma 254/255
Anv. SALONINA AVG
Rev. IVNO REGINA
Ref. RIC 40, RSC 61

   Durante os quinze anos de reinado foram cunhadas centenas de milhares ou mesmo milhões de moedas em seu nome.
    Em termos qualificativos, a percentagem de moedas emitidas pelo casal imperial é globalmente de 15% por Salonina, e 85% para Galiano: tudo isto num período dificil, perturbado  por ursupadores.
    Postúmio na Gália, Macrino e Quietus no Oriente, e ainda as incursões bárbaras dos vândalos e alamanos.
    O estado de guerra cívil ou estrangeira, causou uma necessidade sempre crescente  de moedas e, deu origem a que o  conteúdo de prata nas moedas de bolhão (liga de prata e cobre) fosse reduzido.
   Aos poucos, os  antoninianos do início do reinado cederam lugar a pequenas moedas de cobre, cobertas com uma fina película de prata.
   Os conflitos do período 253/268, e dos anos posteriores, são confirmados pelos numerosos tesouros encontrados e, cuja composição mostra  que foram enterrados no início do reinado de  Aureliano 270, imperador do qual um dos seus primeiros trabalhos foi construir uma muralha à volta de Roma.
    Estes tesouros  monetários que contêm principalmente moedas do fim do reinado de Galiano e Salonina, (em particular a série do bestiário) confirmam a grave ameaça que pesava sobre o império e, parece creditar as teses segundo as quais  Galiano foi assassinado, aquando dum golpe de estado dos generais Ilírios, (liderados por Cláudio o Gótico e Aureliano). 
     Em causa estaria a  sua incapacidade em manter a ordem.
  Durante o reinado de Galiano e Salonina, a inflação monetária originou o desaparecimento das moedas de bronze .
   Com um antoniniano agora reduzido a uma simples rodela de cobre prateada e, com pouco valor, a fabricação de grandes  bronzes tornou-se desnecessária. Sestércios, asses e dupôndius, desapareceram durante o reinado conjunto.
   O tradicional sistema monetário romano continuou em deriva até à implosão final,  que deu origem ao sistema monetário do Baixo-Império. 

CARACTERÍSTICAS DAS CUNHAGENS DE SALONINA


    A multiplicação das emissões e oficinas  monetárias (12 em Roma), obrigou  a uma modernização do sistema monetário e ao aparecimento das letras da oficina ou marca, que permite distinguir o local onde a moeda foi cunhada.
    Para Salonina é principalmente a letra  Q: (uma das oficinas de Roma)

Salonina-Antoniniano, Roma 260/268
Anv. SALONINA AVG
Rev. IVNO REGINA                               
Ref. RIC 12, Gobl 242b.

Para Milão, aparecem as letras MP e  MS,  primeira e segunda oficina.

Salonina Antoniniano, Milão 255/260
Anv. SALONINA AVG
Rev. IVNO AVG
Ref. RIC 62, Goebl 1381e, C 55.


    No Oriente,  para as diversas cunhagens da imperatriz os diferendos utilizados são : estrela (ou sol), crescente de lua, pavão, ou palma.
    Em  algumas emissões, é facil atribuir a data de cunhagem pela referência no reverso ao sétimo consulado de Galiano (VII C).

Salonina-Antoniniano, Antioquia 267
Anv. SALONINA AVG
Rev. AEQVITAS AVG   VII C
Ref. RIC 87, Gobl 1648d, Sear 10625

    O desaparecimento das letras S C (SENATVS CONSVLTVS) em algumas moedas de bronze, parece indicar a continuidade de divergências com o Senado, iniciadas no reinado de Valeriano I.

   A titelatura das moedas de Salonina é clássica e, encontramos nos seus antoninianos SALONINA AVG, COR SALONINA, OU CORN SALONINA AVG e,  um raro antoniniano SALONINA PF AVG, que reflete  a importância da imperatriz. ( PF=PIA FELIX )

Salonina-Antoniniano, Milão 254/268
Anv. SALONINA PF AVG
Rev. AVG IN PACE
Ref. RIC 58, Mir 36, 1377e, RSC 19     

   As moedas de Galiano e Salonina  encontram-se em grande quantidade, especialmente os antoninianos.
    As cunhagens de bronze, e as  provinciais  permanecem raras, sobretudo as da imperatriz.
  Os tetradracmas do Egito são mais correntes. Em contrapartida; os áureos, quinários  e denários, são extremamente raros.

Salonina-Áureo, Viminacium 254/257
Anv. CORN SALONINA AVG
Rev. IVNO REGINA
Ref. RIC 10, Sear5 10616.

   Cada oficina tem o seu estilo particular e, com um pouco de atenção, reconhecemos sem grande dificuldade os locais de produção: Treves, Milão, Roma, Viminacium, Antioquia (talvez ainda outra oficina oriental reconhecida como “Samósata” mas hoje posta em causa), e outras. 

Salonina-Alexandria, Tetradracma 263/264
Anv. KOPNHOA CAΩNEINA CEB
Rev. LIA
Ref. Koln 2967, Dattari 5335, BMC 2258, SNG.

   Estas  cunhagem de Galiano e Salonina são particularmente interessantes  por serem emitidas durante um período de quinze anos, o que é muito raro para imperadores romanos e, revelam nitidamente as dificuldades que afrontaram durante o seu longo reinado.
  Este período, torna-se ainda mais cativante por marcar uma volta na história numismática romana com o desaparecimento do bronze, e a redução quase a zero do antoniniano, ou ainda pela sua fiduciaria.

Salonina-Damasco, AE 22,  253/268
Anv. CORNE SANIONA AVG
Rev. COLΔAMAS METRO
Ref. SGI 4691, Rosemberger 63.

    Envolvida no trágico fim do seu esposo, Salonina saíu da história ao mesmo tempo que Galiano.
  O casal legou-nos uma cunhagem abundante e interessante: históricamente, iconográficamente e  intrinsicamente.

M.Geada

BIBLIOGRAFIA

Biblioteca Wikipédia
François ZOSSO, Christian ZINGG : Les Empereurs Romains – 27 a.C. – 476 d.C., Editions Errance, Paris 1994. 
Sousa; Manuel Félix Geada-História dos Monumentos Romanos Contada Através das Moedas. Coimbra, Julho, 2006


quinta-feira, 25 de outubro de 2012

JUBA II E CLEÓPATRA SELENE



JUBA II  E  CLEÓPATRA SELENE

    Se fossem nossos contemporâneos, Juba II  e sua esposa Cleópatra Selene, (deusa da lua na mitologia grega), teriam tudo para agradar aos mais exigentes jornais e revistas  especializados na  jet-set. (A elite da elite).
   Filhos de pais coroados  que na sua época também foram alvo de crónicas da sociedade e políticas; cresceram e foram educados  juntos no palácio do Imperador Augusto.
    Juba II é filho de Juba I rei da Numídia, que foi vencido por Roma em Thapsus(hoje Rass Dimass na Tunísia), no ano 46 a.C.. Ele e Cleópatra Selene (por vezes também apelidada de Cleopatra VIII), filha de Cleopatra VII e do triunvirado Marco António, conviveram juntos  desde crianças, quando então foram adoptados por Octávia, irmã do futuro imperador romano Augusto.
   Os seus destinos reunia-os em tantas coisas que, a sua união(casamento)ainda que não fosse imposto  por Roma, já parecia inevitável.
   Estes dois príncipes: eram orfãos de pais combatidos e vencidos por Roma, num momento em que  o seu poder era contestado por alguns reinos emergentes.
    Juba I, fez aliança com os Pompeios para combater César: vencidos, suicidou-se depois da derrota.
    Ceópatra VII e Marco António, pais de Cleópatra Selene, também se suicidaram quando a sua tentativa de reinar no Egipto dissociando-se de Roma fracassou.
     O Império que não lhes guardou rancor, não só poupou a vida aos seus filhos, como também suportou a sua educação, preparando-os ao mesmo tempo para reis vassalos.
     O casamento de Juba II e Cleópatra no ano 19 a.C., ainda os aproximou mais devido ao fato de terem em comum a mesma atração pelas artes e letras, e ambos preferirem a cultura helénica à latina.
     A cultura grega muito popular no Império Romano, era um sinal de qualidade e elegância.
     Para Cleópatra Selene isso significava sem dúvida muito mais, porque fazia parte do património familiar.
    Como descedente de um general de Alexandre o Grande, ela pertence à Dinastia Lágida que deu ao Egíto os últimos faraós de origem greco-egípcia: os Ptolemeus.
    A sua célebre mãe Cleópatra instalada em Roma antes de assumir o poder na terra dos faraós, já era conhecida por estar sempre rodeada de grandes filósofos, poetas e artistas.
   A futura rainha do Egipto, acariciava então o sonho de criar um grande império, reunindo as melhores tradições da Bacia do Mediterrâneo: a filosofia grega, a tradição do comércio fenício e, a rica cultura egípcia-africana.
   Desse sonho, a sua filha Cleópatra Selene tornou-se uma verdadeira executora testamentária, quando ao lado do seu esposo, reinou desde a idade de  vinte anos na província da Mauritânia, oferecida por Augusto a Juba II, no ano 25 a.C., com a missão de acalmar os seus sujeitos considerados turbulentos, e expandir os costumes latinos.
    Cleópatra mandou cunhar moedas com símbolos religiosos egípcios  e com alguns animais que eram venerados pelos sujeitos do faraó.
    A capitale da província era IOL(actuale Cherchell ou Cherchel – Argélia), que o seu esposo mais tarde chamou Cesareia em honra do seu bem feitor. Rodeou-se de sábios, artistas, atores famosos e teve por médico o grego Euphorbe.
    A cidade tinha muitas estátuas, (uma das mais belas coleções que hoje se encontra no museu de Chercell), e mandou edificar belos edifícios  de arquitectura clássica, alguns deles representados nas suas moedas.
    Juba II, ele mesmo escritor, tornou-se o autor de uma grande coleção de escritos, entre eles, alguns enciclopédicos ou anedóticos.
    De Juba II, citado muitas vezes por autores gregos e latinos, ainda não se encontrou nehuma das  suas obras.
    Foi dos seus documentos que Plínio o Antigo, tirou grande parte dos seus conhecimentos em botânica, zoologia e geografia.
    Também Plutarco teve recurso aos seus documentos para tirar informações sobre antiguidades romanas.
    Juba II escrevia em grego e tinha uma grande paixão pela cultura desse país, pela qual os gregos o recompensaram mandando erigir uma estátua frente à academia de Ptolomeu .
    Cleópatra Selene faleceu por volta do ano 5 ou 6 da nossa era. Juba II, ainda viveu mais dezoito anos e, apesar de ter acompanhado César neto de Augusto,  ter casado com  Glafira, filha do rei de Capadócia e, viúva de um filho de Heródes rei da Judeia; ele optou por não a levar com ele para Iol, Cesareia.
    Talvez o seu amor por Cleópatra não suportasse a presença de uma rival, num território que a sua primeira esposa marcou profundamente com a sua influência.
    Até a última morada que se atribuíu ao real casal, um mausolée que encima uma colina no sul da cidade na estrada de Tipassa, tem a marca de Cleópatra.
     Este monumento de estilo africano com elementos decorativos  do mundo helénico, ainda não revelou todos os seus segredos sobre a família real mauritana ou númida, ali sepultada.
     Mas tudo leva a crer que foi erigida por Juba II em homenagem à sua bem amada Cleópatra Selene.
     O reinado de Juba II durou quase meio século. O casal teve um filho, Ptolemeu, que pouco despertou a atenção dos historiadores. Apenas sabemos  que foi morto pelo seu sobrinho Calígula em Roma no ano 40, tendo então a Mauritânia sido anexada por Roma.

Juba II e Cleópatra Selene
Denário cunhado em Cesareia (data incerta)
Anv. Busto de Juba com diadema à direita, BEX IVBA;
Rev. Busto de Cleópatra com diadema à direita, BACILICCA CLEOPATRA

Juba II e Cleópatra Selene
Denário cunhado em Cesareia 16/17 a.C..
Anv. Busto de Juba com diadema à direita, REX IVBA
Rev. Crescente de lua, símbolo de Isis e duas espigas, BACILICCA CLEOPATRA

Juba II e Cleópatra Selene
Denário cunhado em Cesareia entre  19 e 6 a.C..
Anv. Busto de Juba com diadema à direita, REX IVBA;
Rev. Crocodilo à esquerda, BACILICCA  CLEOPATRA

Juba II e Cleópatra Selene.
Denário cunhado em Cesareia, 20 a.C. - 20 d.C..
Anv. Busto de Juba com diadema à direita. REX IVBA
Rev. Estrela com seis pontas e crescente. BACILICCA . CLEOPATRA

Juba II e Cleópatra Selene
Denário cunhado em Cesareia 20 a.C.- 20d.C..
Anv. Busto de Juba II  com diadema à direita, REX IVBA
Rev. Busto da África drapeado, com a pele de leão na cabeça, à direita e dois dardos.

Juba II e Cleópatra Selene
Denário cunhado em Cesareia 25-23 a.C..
Busto de Juba com diadema à direita , REX IVBA.
Rev. Símbolo de Isis, sistro, BACILICCA  CLEOPATRA

Juba II e Cleópatra Selene
Denário cunhado em Cesareia no ano 36 d.C..
Anv. Cabeça de Juba com a pele de leão, REX IVBA.
Rev. Cornucópia, tridente, XXXVI
(A representação de Juba II em Hércules em moedas é relativamente rara).

Juba II e Cleópatra Selene
Denário cunhado em Cesareia no ano 36 d.C..
Anv. Cabeça de Juba com a pele de leão, REX IVBA.
Rev. Golfinho à esquerda, coroa de flores, XXXVI.


M. Geada  



Bibliografia



Stéphane Gsell ; Cherchel, antique Iol-Caesarea, Argel 1952.

Mounir Bouchenaki ; Le Mausolée Royal de Maurétanie, Argel 1979.

Artigos de Simon Bourhim ; Facebook





quinta-feira, 4 de outubro de 2012

A MOEDA,  TESTEMUNHO DA HISTÓRIA

    Moulay Sulayman   

    Quando apanhamos o vírus do coleccionismo, as questões que emergem sobre datas, personagens, ou  a decoração das peças, trazem-nos constantemente de regresso à história.
    Para tratar este assunto vou servir-me de uma questão que tem a vantagem de nos fazer viajar no espaço e  no tempo, o que permite fazer a ligação com os nossos campos de interesses.
   Porquê o aparecimento do Sêlo de Salomão  nas moedas de bronze do rei marroquino Moulay Sulayman 1206-1238 H(1792-1822), ?
     Para começar, penso que vale a pena assinalar que na cultura árabe, o valor que é dado ás moedas de ouro, de prata ou bronze, não é comparavel ao que lhes é atribuído no mundo ocidental, que estabelece a base do seu valor quase exclusivamente na nobreza do  metal.
   Nos países árabes, as moedas de ouro ocupam um lugar de destaque nos dotes e grandes transações, enquanto as de bronze são consideradas como um metal pouco nobre.   
   No início do reinado de Moulay Sulayman, a situação económica e financeira do país era tão desastrosa, que era práticamente impossível, ao sultão, produzir moedas de prata para as suas transações devido à indisponibilidade de metais preciosos.
   Ao mesmo tempo que permitia a livre circulação das moedas de prata europeias, Moulay Sulayman, teve a brilhante ideia de substituir o dirham, moeda de prata do país, por uma de bronze marcada com o Sêlo de Salomão no anverso e, por vezes nas duas faces da moeda.
  Chamadas  “Fels Slimane”, (Fels Moulay Sulaymam) essas moedas têm uma figura hexagonal em forma de estrela, formada por dois triângulos equiláteros entrecruzados, com um ponto no centro.

 
4 Fels N.D.(Hégira, 1206-1238), 30mm bronze, sem marca de ateliê, (KM 103)
   
Como é que um simples  símbolo consegue  que a população aceite uma moeda cunhada com um metal  pouco prestigiado?
   Claro que  podemos avançar com a hipótese que foi o Sêlo de Salomão, agora marca do sultão Moulay Sulayman, a causa desta aceitação. É possível, mas os historiadores pensam não ser esta, uma razão suficiente para explicar a reacção positiva da população.
    De notar qua a utilização do Sêlo de Salomão no fels de bronze, foi sempre aprovada pelo povo e durou mais de 100 anos. Só no ano  1310 H, numa tentativa de modernizar a aparência das moedas, é que o Sêlo de Salomão foi substituído, o que deu origem ao descontentamento da população.
   A figura hexagonal era originariamente um escudo feito com duas peles unidas com um rebite de bronze, o que  segundo a  filosofia antiga e medieval, reúne num só símbolo os quatro elementos naturais : fogo, água, ar e terra.
   Como sinal mágico, ele actua como medida preventiva; como um escudo protector. Além disso o seu efeito é reforçado pelo facto de também representar um par de olhos convencionais; uma proteção contra o mau olhado, um poder mágico e um direito.

  
3 Fels N.D. (Hégira, 1206-1238), 25mm bronze sem marca de ateliê, (KM 99.2)

    Temos então nas moedas de bronze do sultão Moulay Sulayman um Sêlo de Salomão que serve de mensageiro ao sultão e, ao mesmo tempo é um sinal de proteção.
    A sua forma particular, com um ponto ao centro que representa um olho, é exclusiva para as moedas de bronze, porque este é considerado um metal pobre extraído das minas e do fogo da fundição, lugares que são frequentados por espíritos malignos e caracterizados por um odor particularmente desagrádavel, que lhe valeu o apelido “del-muntin” (o malcheiroso).
   Com este sinal (o ponto no centro), o metal perde os malefícios da sua origem para passar a ser um objecto benéfico.
   Podemos reconhecer em tudo isto a tenacidade que subsiste das crenças pagãs,  que não são únicamente exclusivas ao Ocidente Muçulmano.
   Moulay Sulayman teve uma excelente  ideia ao introduzir nas moedas de bronze o Sêlo de Salomão. A população,  há mais de vinte anos privada de moedas de prata cunhadas em Marrocos, aceitou-as sem contestar.
   As transações eram feitas com moedas europeias de prata, e com os famosos fels marcados com o Sêlo de Salomão. Esta estratégia salvou Marrocos da crise e, permitiu a estabilização da moeda de prata que tinha perdido 20% do seu valor e  a sobrevivência do comércio externo e interno.
   Aos poucos o dinheiro entrou nos cofres do Estado, o que permitiu ao sucessor  de Moulay Sulayman cunhar novamente moedas de prata. 


1 Fels A.D. Hégira,,1211(1796), 22 mm Bronze, cunhado em Fez,(KM 99.5)
  
   Esta página de história marroquina  sobre  as moedas de bronze cunhadas durante o reinado de Moulay Sulayman, é simplesmente um exemplo de como a moeda é um reflexo da história dos povos.
  O calendário muçulmano começou no ano 622 d. C., o ano da Hégira (fuga de Maomé de Meca para Medina).

M. Geada

BIBLIOGRAFIA

KRAUSE; Mishler(KM)  - Standard Catalog of World Coins
(1) EUSTACHE;  Daniel - Corpus des Monnaies Alawites . Banque du Maroc, 1984













sexta-feira, 14 de setembro de 2012


NA PROCURA DO DINHEIRO DE JUDAS


   Tentar reconstruir uma história acerca do dinheiro que tenha sido objecto de troca na célebre traição de Judas, deveria, como trabalho de investigação, obedecer e respeitar certas características sobre o seu conceito e objectividade.
  Em primeiro lugar exigirá o respeito pelo seu argumento histórico, e obviamente, uma comparação sobre as suas fontes, como forma da salvaguardar o melhor possível, tanto a sua fiabilidade, como a credibilidade, de que precisamos para corroborar os factos.
  Infelizmente, neste caso, essa análise comparativa não será de todo possível, visto a sua génese, ter como único elemento de documentação, alguns legados evangélicos dos Apóstolos S. Marcos, S. Lucas, S. João e S. Mateus. Tudo o que realmente possuímos e sabemos sobre a traição de Judas, é-nos relatado por esses escritos bíblicos, e por isso também a análise terá de ser cautelosa e consciente, sobre a forma como o sentido místico em interpretações ulteriores, poderá ter tido influência e criado limitações quanto à veracidade dos factos.
  Por tudo isto, nesta minha análise interpretativa deste “caso” histórico, pela sua forma intuitiva, torna-se mais empírica que científica.
  Terá sido no ano19 d.C. no reinado do imperador Tibério que Jesus Cristo foi crucificado.
  Nesse tempo, a Judeia era então uma província romana, e como tal nela se aplicariam as principais decisões que vinham de Roma. Seria portanto natural que a moeda principal que circulava fosse romana, ou provincial romana, embora se tenha conhecimento de que a algumas outras moedas fosse permitida a sua circulação, como o exemplo das moedas da dinastia de Heródes.
  Na generalidade da literatura, argumenta-se que Judas terá recebido pelo préstimo da sua traição, trinta moedas de prata. Neste ponto creio que todos os historiadores convergem.
  No meu ponto de vista, e para passar aos factos, pela característica que conhecemos hoje das moedas que então terão circulado, excluo as moedas de ouro como o”áureo”, o ”quinário” em prata, assim como os “sestércios”, “dupôndios” e “asses”, geralmente cunhados em bronze.
  Interessante salientar contudo, que no reinado de Tibério, só foram cunhados dois tipos de “denário”(denário do latim denarius) em prata. Não havendo conhecimento de que tenha sido cunhado nenhum outro tipo de moeda em prata, durante o período deste imperador 

Tibério, Denário emitido no ano 14 d.C. em Lião (França) 3,78grs.

    O primeiro denário, cunhado no ano 14 d.C. em Lião, apresenta no anverso o busto do imperador Tibério com a legenda “TI CAESAR DIVI AVG F AVGVSTVS”. No reverso apresenta Lívia, (sua mãe) ou a Pax, sentada, com um ramo de oliveira na mão esquerda, e um bastão na mão direita, com a legenda “PONTIF MAXIM”. ( Há divergências acerca da  figura do reverso).
   O segundo, terá sido cunhado no ano 16 d.C., e igualmente em Lião. Também este apresenta no anverso, o busto de Tibério, com a mesma legenda do primeiro. No reverso, apresenta o imperador conduzindo uma quadriga, com a legenda “TR POT XVII IMP VII”. O seu peso era variável, e valeria o equivalente a dez “asses”.
   Temos então, que estas moedas circulariam em todo o império, aquando da morte de Jesus Cristo. E, poderíamos concluir, que qualquer destas moedas “denários”teria grandes probabilidades de ter servido de aliciamento no negócio que propuseram a Judas. Mas, porque não inclui-los também misturados com outras moedas, ou simplesmente um outro tipo de moeda em prata?
   Alguns elementos substanciais transmitidos no legado dos quatro apóstolos servem para esclarecer algumas dúvidas sobre estas hipóteses.
   Hoje, no nosso quotidiano, e na nossa cultura, utilizamos o termo “dinheiro”. Mas, na ligação que se lhe faz, quando se menciona este caso de Judas, a palavra “dinheiro”, terá evoluído, e colado na sua identificação popular, aparecendo o termo tanto na literatura, como no cinema, e em que usado desta forma, se estará a deformar uma realidade histórica.

Denário emitido no ano 16 d.C. em Lião - 3,94grs.

   Nas sagradas escrituras, no que pesquisei, não vi mencionada a palavra “dinheiro”. Uma bíblia editada em 1859, que folheei numa biblioteca, foi-me bastante útil.
   Dos quatro evangelistas que se referem a este caso, dois deles, S .Marcos e S. Lucas, afirmam que Judas vendeu Jesus, mas sem dar pormenores sobre o montante do negócio.
   No evangelho de S. João, faz referência a trinta moedas de prata.
   É contudo, S. Mateus que na sua narração, nos poderá esclarecer mais sobre este assunto.
   Acusando o seu condiscípulo Judas, por este ter vendido o Mestre pela soma de trinta “siclos”de prata. Teria ele sido colector de impostos para falar desta maneira tão formal, no que se refere a “siclos”de prata?
  Não encontrei nada, que me tenha dado indicação de que alguma vez se tenha usado a palavra “siclo” em referência  ao assunto que tratamos.
   O termo “siclo” é conhecido como uma medida antiga, que equivalia a 6 gramas de prata.
   Mas na narrativa de S.Mateus, também poderia ser a moeda de prata utilizada por fenícios e hebreus, que em hebraico era designado por “shekel”.
   É pois muito provável que Judas tenha traído, e sido pago com 30 (trinta) “shekels” de prata.
   Julgo que naquela época, o único tipo de moeda de 1 (um) shekel em prata que circulou na região tenha sido o “shekel” dito de Jerusalém (como nas moedas de Tiro).
   Era uma moeda que pesava mais ou menos 14 a 15 gramas, e circulou em grande quantidade, tendo sido feitas várias cunhagens deste tipo de moeda. Uma delas foi precisamente no ano 33 d.C. O ano da suposta morte de Jesus Cristo? Aqui também existem muitas divergências, embora as datas que aparecem com mais frequência sejam entre os anos 30 e 33 d.C.
  O “shekel de Jerusalém” em baixo retratado, apresenta no anverso o rosto do antigo deus Melkart, também conhecido por Baal, virado à direita, e no reverso apresenta uma águia virada à esquerda.

Judeia, Shequel de prata 14,27grs. cunhado em Jerusalém 12/11 a.C., (provavelmente terá servido de tributo a Judas) A efígie de Melkart é totalmente diferente do shekel de Tiro.

   Atendendo a que o preço de um escravo, naquela época, seria de 180 g de prata, poderemos calcular que Judas no negócio efectuado, teria vendido o Mestre por cerca de 4,250 Kg de prata.
  Creio pois, ser o “shekel de Jerusalém” a mais provável moeda que procuramos identificar nesta história, pese embora o risco de decepcionar alguns coleccionadores que já possuam uma, ou as duas variantes do “denário” de Tibério, denominados por “dinheiro de Judas”.
   Contudo, estes dois “denários” continuam a ser extremamente interessantes, quem sabe se não terão sido utilizados pelos soldados romanos que guardavam o sepulcro, enquanto jogavam aos dados sobre a túnica de Jesus Cristo, o que lhes confere sempre uma grande história.
   O que lamentamos, é que ao longo dos tempos o conceito que nos parece mais plausível para esta história, por motivos menores, se tenha adulterado, e sobreposto ao texto original.
   Dizer que Judas entregou Jesus Cristo por 30 dinheiros, sempre é mais cómodo que dizer, Judas entregou Jesus Cristo por 30 shekels.
   Afirmar quais as moedas que pagaram a traição de Judas, é tarefa difícil, senão impossível.
   Denários da época de Augusto? Dracmas, siclos, ou shekels?
   Pouco provável é que tenha recebido denários de Tibério. Isto porque mesmo as cunhagens em grande quantidade, demoravam muito tempo a entrar em circulação, sobretudo nas províncias longínquas do império, como a Judeia onde circulavam muitos tipos de moeda.
   Esta questão, levantou-se na Idade Média, e foi proposto ou entendido pelos dirigentes eclesiásticos da época, que a moeda representativa desse facto histórico deveria ser uma moeda que representava Cristo com uma coroa de espinhos.
   De facto existe um “dracma”de Rodes que representa o deus Hélios ( na mitologia associado ao Sol ), com a cabeça adornada com raios, parecendo Jesus Cristo com a coroa de espinhos. Essas moedas, foram na época alvo de uma grande devoção.

Cária - Rodes, Dracma 175-170 a.C.


Bibliografia

Le Douzième Apôtre; Fac- Reflexion n°22, Fevereiro 1993, PP 14-26
(Le cas de Judas et la doctrine de la reprobation)
Centre Numismatique du Palais-V. S. O.  Paris 28-06-2002. 
http://www.vcoins.com/ancient/calgarycoin/
http://www.sacra-moneta.com/Monnaies-grecques-antiques/La-drachme-de-Rhodes.html

M. Geada